“Ira e tempo”: os livros que eu li e o abecedarismo sindical

Na sexta, 19, passei na Cesma a tardinha para ver as novidades e saí de lá com um pacotinho. Um Rosenstock-Huessy, sobre a origem da linguagem, ao qual cheguei por sugestão de uma aluna, um Todorov sobre as inimizades da democracia e um Sloterdjik recém saído do forno, Ira e Tempo, numa primorosa tradução do operosíssimo Marco Casanova.No sábado, cedinho, abri a Ira e somente consegui parar de ler o livro no domingo, na tardinha. Felizmente faço Pilates faz uns cinco anos e consigo ainda aguentar dois dias e trezentas páginas, apenas com os intervalos habituais da carne. Faz muito tempo que um livro não me prende assim. Seria um exagero dizer que o ultimo que me fez tal coisa foi a Instituição Imaginária da Sociedade, do falecido Castoriadis. Mas quando pensei em qual livro havia me apaixonado tanto assim nos ultimos verões, juro que cheguei a me lembrar do grande meteco. Depois me dei conta que seria desproporcional ao gigantismo da tarefa do Cornelius. Mas, confesso, pensei nisso. O livro do Peter Sloterdjik foi saudado pelo Der Spiegel com a frase: “Quem leu este livro passou a pensar de outra forma sobre o presente.” Eu diria que, marketing a parte, a frase tem seu ponto. E foi apenas por causa do impacto do livro que eu me dispus a pensar um pouco mais sobre os tais dos tres por cento das pessoas da Boca do Monte que votaram no PSTu e no PSOL, e nos programas desses partidos e nos sindicalismos que eles promovem no Brasil.
Eu não ignoro que algumas pessoas, simbolicamente, querem minha cabeça pelas barbaridades que eu escrevo aqui no blogue sobre o sindicalismo abecedarista que assola os campi. Eu gostaria, sinceramente, de continuar a conversar sobre o tema, mas ando cada vez mais neurotico sobre minha preparação de aulas e meus pequenos compromissos acadêmicos, que não estou disposto a comprar briga nenhuma e com ninguém. Mas tenho que dizer, pelo amor às minhas neuroses, que essa leitura do Sloterdjik mexeu comigo ao ponto de me fazer querer pensar sobre esses temas das promessas de abolição de catracas e seus equivalentes acadêmicos, a abolição dos méritos, a condenação do produtivismo, um certo “abecedarismo” reinante no sindicalismo universitário federal.
Sei lá o que vai dar isso. O nome do livro, repito, é “Ira e Tempo”.
O tempo, como se sabe, como sempre, ficará mudo.
Mas eu, que fazer, não posso deixar de ver o que vi: a abolição das catracas tem tudo a ver com nossas “breves”.

Uma resposta em ““Ira e tempo”: os livros que eu li e o abecedarismo sindical

  1. Ronai, em nossa conversa hoje de tarde mencionaste algo que muito me interessa e que “enquadraste” (forte isso, não?!) sob o título aproximado de psicologismo político ou na política (se não engano). Contudo, as questões que colocas acima, no final do teu post, também me instigam a ler o livro. Afinal, elas vão ao encontro de uma inquietação que me acompanha já há algum tempo e que, se não se corresponde a um interesse filosófico ou de pesquisa, me “descompensa” enquanto alguém que sempre se percebeu como de esquerda.. Afinal, o que aconteceu com parte significativa da esquerda que não mais seduz nem mesmo os tradicionalmente adeptos a ela? No mínimo duas são as hipóteses: ou eu me “tornei adulta” e faço cumprir a “profecia” de que esquerda é coisa de jovem (lembro que me contavam uma piada do gênero quando eu era mais nova) ou parte da esquerda se tornou conservadora, se confundindo, portanto, com aquilo que teoricamente teria que combater. E, aqui, falo no conservadorismo como algo simples: postura de conservação, manutenção, não mudança, não devir. Enfim, querido, obrigada por compartilhar tuas buscas, teus encontros, tuas ideias.. Abraço!

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